terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Vai que pega
É irônico que precise de 171 assinaturas para apresentar um projeto para mudar a Constituição. Era o trabalho de Josilvado catar assinatura de deputado para esse tipo de projeto e ele lembrava dessa ironia enquanto buscava a última necessária para a proposta de um parlamentar catarinense. O deputado nem explicou o projeto, só deu a dica:
- Fala que é sobre os problemas climáticos de Santa Catarina que todo mundo assina.
Ele estava certo. Bastou dizer isso e 170 canetas, apressadas, logo deslizaram sobre o papel. Invejava a esperteza do chefe quando avistou uma deputada iniciante, recém-promovida da suplência. Essas são as mais difíceis, pensou. Levam a sério o que assinam, pedem detalhes. Mas, sendo a última, arriscou:
- Deputada, estou juntando assinaturas pra uma emenda constitucional do deputado Lúcio, de Santa Catarina...
- Sobre o quê?
- Os problemas climáticos lá do Estado, a senhora sabe...
- Realmente, Santa Catarina tem sido muito castigada. Qual é a proposta?
- É pra dar um jeito nessa situação, deputada.
- Mas só mexendo na Constituição? Como assim?
- Ahn, obrigando a investir na prevenção - chutou.
- Tá, gostei. Dê cá o papel - disse a parlamentar.
Não deu uma hora, a deputada encontrou o colega autor e foi falar sobre o projeto que acabara de endossar.
- Seu assessor disse que a emenda obriga investimentos em prevenção...
- Não, não. A minha emenda torna inconstitucional qualquer tipo de chuva no litoral catarinense entre 20 de dezembro e 20 de janeiro.
- Como assim?
- A senhora não viu na TV os turistas passando Réveillon debaixo d'água? Isso vai acabar comprometendo o nosso turismo.
- Mas vão punir quem se chover? São Pedro?
- Cara colega, essa parte de regulamentação de dispositivo constitucional é com o governo federal, eu faço minha parte apenas.
- Mas é um absurdo!
- Querida deputada, é tanta lei que pega, que não pega. Vai que essa pega?
(publicado na Revista de Verão do Diário Catarinense do dia 20 de janeiro de 2012)
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