quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

Consolação

Esperava o amigo no metrô Consolação há mais de vinte minutos. Não ajudava nada o fato de ter chegado vinte minutos antes da hora marcada, só aumentava a ansiedade. Todo final de semana aquela história de esperar alguém na catraca do metrô se repetia. Talvez fosse hora de inventar outros pontos de encontro, mas era tão simples que acabava marcando ali mesmo quando nem vinha de metrô. Perto dele uma menina também esperava. Ele se interessou porque era uma daquelas roqueirinhas moderninhas, no mesmo estilo que ele via no Atari ou no Dj Club. Não achava grande coisa no estilo, mas gostava de olhar. E era bonitinha também – além de fazer exatamente a mesma cara de "saco cheio de esperar" que ele também fazia desde que chegou à estação.

Aquela rotina de ouvir o metrô chegar e ficar olhando pra escada rolante estava ficando insuportável. Via a menina e ela também parecia impaciente. Pensou em ir falar com ela, puxar assunto. Aquela coincidência de esperar e a meia-dúzia de olhares trocados poderiam ter criado alguma espécie de intimidade. Seria fácil... três passos, um "oi". E depois? Não estava mais acostumado a conhecer gente, principalmente assim, sóbrio desse jeito. O que diria? "Oi... você sempre espera as pessoas aqui no metrô?". Cretino. Se cretinice pagasse imposto, ele teria problemas. Pelo menos era nisso que pensava e já tinha certeza de que não falaria nada para a menina. Estava até começando a olhar menos.

Olhou para o relógio da estação. O amigo já estava quinze minutos atrasado. Maldito. Assim chegariam atrasados ao show. Olhou pra menina de novo e tentou disfarçar quando percebeu que ela também olhava. Pensou em escrever uma história sobre um casal que se conhecia no metrô, depois de uma hora esperando alguém que não apareceu. Talvez ficasse bacana. Mas ele não conseguia imaginar uma forma verossímil de começar um diálogo entre duas pessoas que não se conhecem e estão esperando alguém numa estação de metrô. Tudo parecia cretino ou óbvio demais. Aliás, se ele soubesse o que poderia ser dito, não guardaria pra escrever em casa. Foi quando olhou para ela mais uma vez e a viu chegando mais perto para falar.

- Você tá esperando sua namorada?

"Ela veio, ela falou, responde rápido."

- Não! Não... eu estou esperando um amigo. E você? Esperando namorado?
- Não... quer dizer... eu estou esperando minha namorada.

"Namorada? Ela é bem Atari mesmo. Eu devia ter imaginado. Seja natural, seja natural."

- Ah... bacana. Tá esperando há muito tempo?
- Quase uma hora. Tô começando a achar que ela não vem.
- Ah, vem sim. Eu tô esperando há uns 40 minutos... mas nem posso reclamar muito, cheguei 20 minutos antes.
- Pra onde vocês vão?
- A gente vai dar uma passadinha num lugar onde um amigo meu ta botando som e depois vai pra um show e você?
- Ah... num bar na Augusta. Tão esperando a gente lá.
- Legal...

A conversa continua. Falam de nomes, lugares, gostos, da chatice que é esperar no metrô. Só interrompem quando chega um trem e com ele a expectativa de que surjam as pessoas que esperam. Apesar de que agora ele torce para que ambos levem um bolo e possam terminar de se conhecer em outro lugar. Um lugar onde se possa sentar e beber, de preferência. Até que a menina interrompe a conversa pra dizer "é ela!". Vai até a catraca, abraça e beija a outra, falam alguma coisa. Volta.

- Foi um prazer.
- Foi sim.

Sorrisos, beijos no rosto, nenhum contato trocado. Elas vão embora de mãos dadas e ele continua a espera pelo amigo cretino atrasado. Mas pelo menos já sabia como começar o diálogo entre os dois personagens que se conhecem no metrô...

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