segunda-feira, 30 de março de 2020

Quarentenares #08

Bebo vinho sem maiores pretensões esta noite. Quais as pretensões da quarentena? Sair dela, claro. Sair bem dela, obviamente. Vinho ajuda, um carmenere chileno tem seu valor. Toda vez que venho aqui e começo a divagar nas madrugadas, bate uma pequena culpa - que tende a aumentar durante estas noites de quarentena. Eu deveria estar escrevendo meu romance.
Este blog tem alguns contos - e gosto de alguns. O último foi em 2012 e meu erro foi gostar demais. Porque depois dele, achei que estava pronto para uma narrativa de fôlego, para uma obra que eu pudesse publicar como livro - meu primeiro livro. E desde então, não escrevi mais nada nessa seara. Umas crônicas, uns poemas soltos, muito artigo de jornal, mas nunca mais brinquei com personagens, diálogos e cenários. 
Eu sei explicar porque travei depois de Vale (quase) tudo. Comecei a procurar A HISTÓRIA, aquela que merecia ser contada no meu PRIMEIRO ROMANCE. Algumas pareceram ser, esbocei alguns começos, algumas linhas, alguns fiapos de narrativa. E sete anos se passaram. 
O Brasil mudou tanto nestes sete anos que hoje aquele conto que gostei tanto em 2012 me causa algum desconforto. Era uma brincadeira distópica sobre um país revisitando e censurando seu passado em nome da defesa das minorias. Exagerada como toda distopia, mas com alertas que faziam sentido naquele contexto. Hoje ele serviria para dar argumentos a verdadeiros e nocivos censuradores, até tenho medo de que encontrem o texto e o usem. Mas, mesmo assim, continuo gostando.
Sinto que ano passado que encontrei o primeiro romance - por isso contei sete anos de 2012 até agora, em vez de oito. Escrevi cinco capítulos. Gosto do personagem, do cenário, da mistura de ficção e realidade decidir fazer. Mas não coloco uma linha a mais nele desde outubro. Travei mais uma vez. É como se eu não me sentisse habilitado para contar a história que me propus a contar. 
Quando abri o vinho e sentei aqui... mentira, eu sentei aqui quando a garrafa estava na metade. Quando bebi metade da garrafa de vinho e sentei aqui, pensei em retomar a história daquele personagem que já amo. Mas sentei, abri esta janela e falei de mim mais uma vez. Escrever sobre escrever é o futuro do escrever, disse Haroldo de Campos e nunca esqueci. Eu não sou de esquecer, mas só lembro o que convém. Lembro que amanhã preciso comprar mais vinho, não esqueço que preciso retomar a história de Tavinho. Lembrar e não esquecer são duas coisas muito diferentes.

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