sábado, 18 de abril de 2020

Quarentenares #11

Hoje eu fui ao supermercado comprar uma planta. Fiquei encantado por uma dracena e a trouxe para casa a pé - ainda bem que moro perto. Uma amiga me viu no caixa, eu e a planta, e questionou:
- Por que você está levando uma árvore em vez de cerveja?
Não reconheci a amiga imediatamente, maldita máscara, e disse que já tinha cervejas em casa. Duas garrafas de chope, duas de vinho e uma de gin cheias, dois martinis - branco e rosso - já parcialmente consumidos, para ser mais preciso. Eu não precisava de bebida, precisava de uma planta exuberante na sala de casa.
O isolamento tem despertado em mim muito do que diziam que o signo de touro deveria me evidenciar e que nunca me arrebatou. Especialmente a vontade de querer cuidar e cultivar o meu espaço, o meu lugar. Tenho feito isso com o apartamento que aluguei três meses atrás. Foi uma sorte nestes tempos quarentenares a mudança. Eu tenho um lugar para fazer meu depois de oito anos acomodado a um espaço que amei muito e que há bom tempo era puro estorvo. 
Apartamentos são como amores. Estou agora apaixonado. E apaixonado que estou, agora, só quero mimar minha paixão. Por isso, cuido. Os quadros na parede, as estantes montadas, a disposição de mesa, escrivaninha, sofá, baú, estantes, livros. Um espelho bonito que sempre quis que fosse meu. Qual o limite? Ultrapassar meus limites pessoais. Um deles, ter plantas em casa. E se é para ultrapassar limites, que não seja com um pequeno cacto, com vasinhos. Quero uma árvore, como disse a amiga na fila. Algo com tronco e grandes folhas, algo exuberante. 
Ela está ao meu lado enquanto escrevo, a dracena. Estou chamando-a de Bethânia, coisas vivas precisam ter nome. As coisas precisam ter nome para que possamos chamá-las pelo nome. Uma mulher que me impressiona muito e que quero muito impressionar disse, logo após ver a odisseia da planta na sala, que estava impressionada pelo quanto sou dedicado às coisas. Ler isso valeu o esforço de carregar Bethânia por quatro quadras do Centro de Florianópolis num fim de tarde de sexta-feira. 
Não só por impressioná-la, mas também por me permitir ver, naquele comentário, o que eu via de novo em mim. Esse querer que o meu canto seja o melhor lugar da vida, que seja minha casa, meu trabalho, meu bar. A felicidade de ser descoberto neste momento em que me descubro e digo: prazer, Upiara.
Se a quarentena acabar amanhã, não sinto vontade de correr para retomar a vida que vinha levando. Tanta coisa mudou, tanto mudei. Olho pra Bethânia, minha linda dracena. Olho pra Caetano e Flávio, meus gatos ruivos. Olho para este apartamento que já é uma extensão de mim e será cada vez mais. Olho, e tudo que penso é que tenho mais saudade do que ainda vou viver do que das coisas que já vivi. E que o passado é um abraço que quero muito dar, mas que os beijos - ah, os beijos - fazem parte de uma vida que tenho para viver quando esta clausura acabar. Abrigando tudo que aprendi durante estes dias pandêmicos, mas pronto para tudo que me impressiona. E para tudo que quero impressionar.

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